Proposta do Consema para regularização de drenagens é questionada

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Nesta sexta-feira (29), durante whorkshop sobre drenagem em áreas úmidas, promovido pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, estudiosos da área demonstraram preocupação em relação à proposta de resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) para regulamentação da proteção e o licenciamento ambiental de atividades e empreendimentos localizados em áreas úmidas no Estado.

Segundo a coordenadora do evento, promotora de Justiça Ana Luíza Ávila Peterlini, entre os riscos da proposta do Consema estão a permissão de instalação de atividades de pequeno e médio impacto, utilização de escala inadequada e a regularização de canais de drenagens já existentes. Ela citou ainda que a minuta de resolução elaborada em 2016 foi totalmente desconsiderada pela atual proposta. “Não é uma resolução protetiva, é uma resolução permissiva, uma resolução para regularizar as drenagens que já foram feitas ilegalmente”, afirmou.

A professora pesquisadora da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Cátia Nunes da Cunha, também demonstrou inquietação. “Vivemos um momento de pressão para mudança da legislação. O Brasil vive um processo de desregulamentação e Mato Grosso reflete isso”, consignou a professora pesquisadora da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) Carolina Joana da Silva, mediadora de um dos debates.

“A gestão sustentável da água é fundamental para o futuro da alimentação e da agricultura. E a proposta discutida no Consema compromete, antes de tudo, a produção agrícola no Estado”, acrescentou a professora Cátia da Cunha, apontando para um possível colapso no sistema, uma vez que a atividade agrícola necessita de irrigação.

Cenário – Levantamento realizado pelo Centro de Apoio Técnico à Execução (Caex) Ambiental do Ministério Público de Mato Grosso (MPMT), em parceria com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema-MT), apontou a existência de 5.434 drenos nas três grandes áreas úmidas do Estado: Pantanal do Paraguai, Guaporé e Araguaia. Juntos, correspondem a aproximadamente 4.961km de extensão considerando a estrutura retilínea e não a área atingida. Amplitude superior à distância de Oiapoque a Chuí em linha reta, que é de 4.175km.

Os perigos e reflexos da drenagem artificial de áreas úmidas em Mato Grosso foram debatidos durante o workshop realizado pela 15ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente Natural de Cuiabá. Cerca de 60 pessoas participaram do evento presencialmente, no auditório da Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ). A transmissão ao vivo feita pelo YouTube foi acompanhada por aproximadamente 200 pessoas (assista aqui). O engajamento de membros do Ministério Público, especialistas em meio ambiente, técnicos, pesquisadores e gestores demonstra a importância social do tema.

A promotora de Justiça Ana Luíza Ávila Peterlini explicou que as informações levantadas subsidiarão dois inquéritos civis em andamento na Promotoria, que apuram a ausência de procedimento para licenciamento ambiental de obras de drenagem e omissão do Estado no controle e fiscalização dessa atividade de alto impacto ao meio ambiente, bem como exploração econômica das áreas úmidas dos rios Guaporé e Araguaia.

Dividido em duas etapas, o workshop tratou inicialmente das “Bases conceituais para o uso e gestão das áreas úmidas” e depois da “Proteção jurídica e levantamentos técnicos de obras de drenagem em Áreas Úmidas”. Conforme apresentado, “Áreas Úmidas são ecossistemas na interface entre ambientes terrestres e aquáticos, continentais ou costeiros, naturais ou artificiais, permanente ou periodicamente inundados ou com solos encharcados”. Elas podem ser de águas doces, salobras ou salgadas, com comunidades de plantas e animais adaptados à sua dinâmica hídrica. São ambientes fundamentais para o ciclo da água, para a conservação da biodiversidade, para a regulação climática e para o fornecimento de alimentos. Ou seja, fornecem serviços ecossistêmicos essenciais para a natureza, a economia, a saúde e o bem-estar de populações humanas.

Painéis – Na primeira parte do workshop, a professora pesquisadora da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Cátia Nunes da Cunha, o analista de Meio Ambiente da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema-MT) André Pereira Dias e a engenheira agrônoma Letícia Thommen Lobo Paes de Barros apresentaram conceitos, delimitações, impactos do esgotamento das águas subterrâneas especialmente na produção agrícola, estudos e casos concretos de ecossistemas alterados por essa prática danosa.

No painel “Proteção jurídica e levantamentos técnicos de obras de drenagem em Áreas Úmidas”, a promotora de Justiça falou a respeito da proteção jurídica das áreas úmidas fixada pela Convenção sobre as Zonas Úmidas de Importância Internacional de 1971 (Convenção de Ramsar), pelo Código Florestal brasileiro, por julgados em instâncias superiores, pela recomendação do Comitê Nacional de Zonas Úmidas (CNZU) e por decretos estaduais. Relatou o andamento dos inquéritos no MPMT e destacou a ausência de regulamentação para exploração e drenagem de áreas úmidas em Mato Grosso.

Na sequência, a assistente ministerial do Caex Ambiental Jessica Melanya Sisti de Paiva apresentou as demandas recebidas pelo centro de apoio e citou exemplos do que encontram em campo, como drenos de 10km de extensão por exemplo, na região de Barão de Melgaço. Relatou que os reflexos identificados são a alteração na flora, fauna e solo, rebaixamento do lençol freático, diminuição da água na paisagem, processo erosivo, risco de incêndio florestal, entre outros. Observou a incongruência encontrada em campo, onde o mesmo proprietário que faz dreno abre poço para captação de água. “O dreno altera a água do sistema de forma ampla, atingindo poços também”, ponderou.

Também participou do painel o procurador do Estado e professor pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Carlos Teodoro José Hugueney Irigaray. A mediação ficou a cargo do procurador de Justiça titular da Especializada em Defesa Ambiental e Ordem Urbanística, Luiz Alberto Esteves Scaloppe.

Dados – Conforme apresentado pelos expositores, 5% do planeta é ocupado por áreas úmidas. No Brasil, 20% do território é formado por esses ambientes e, em Mato Grosso, a estimativa é de que esse 15% sejam áreas úmidas.

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