Depoimentos de médicos da rede pública de Cuiabá ao Ministério Público Estadual (MPE) reforçaram a gravidade da crise histórica do setor: o caos e a falta de condições de trabalho é total nas unidades de Saúde da Capital.
Dentre as experiências relatadas, os médicos falam até mesmo sobre mortes de pacientes e falta de medicação básica, como dipirona.
O que me trouxe aqui é que nunca, nesses quase 30 anos de serviço público, a Saúde esteve tão ruim. Falta tudo, de estrutura, medicação, especialistas… Dipirona tem mais de anos que não tem. Às vezes chega uma caixinha que não dá para cinco dias”, afirmou a médica E.S.M.C., Concursada na Capital desde 1997.
Ela relatou ao MPE que sempre atuou na atenção básica da Capital, mas que nunca presenciou um serviço tão ruim quanto na gestão do prefeito Emanuel Pinheiro (MDB).
Os depoimentos a que o MidiaNews teve acesso foram colhidos pelo Núcleo do Patrimônio Público da Capital, em novembro deste ano (confira ao final da matéria).
O relato dos profissionais deram embazamento para que o MPE realizasse, no início deste mês, uma inspeção conjunta em unidades de Saúde geridas pela Prefeitura de Cuiabá.
Em outro trecho, a a médica E.S.M.C. relatou a situação da farmácia básica nos Prontos Socorros de Cuiabá: não há nem 15% dos itens considerados básicos pela própria Prefeitura, entre remédios e insumos. Dos 175 listados como obrigatórios, Cuiabá só tem 26 na unidade em que a médica atua.
Ela disse que a falta de estrutura e de profissionais se agravou ao ponto de causar a morte de pacientes que precisam de atendimennto.
“Recentemente, uma das coisas que impactou bastante a gente foi a perda de uma menina de 16 anos que apresentava sintomas de tumor cerebral, e a gente não conseguiu fazer a ressonância, não conseguiu um neurologista”, disse.
“Só nos últimos dias, que a coisa agravou muito, que a gente conseguiu interná-la em uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento), de lá para o HMC (Hospital Municipal de Cuiabá) e morreu”, completou.
Falta de antibióticos e colapso cardíaco
Outra profissional que também vive o drama no dia a dia é a médica C.S.A., que atua no antigo Pronto Socorro. Em seu depoimento, ela apontou a falta de medicação como sua maior preocupação.
“A gente tem falta de muitos medicamentos básicos, para controle de pressão arterial, sedativos, psicotrópicos, antibióticos, até falta de soro temos lá. É bem caótica a situação do Pronto Socorro”, disse.
“Vários óbitos foram relacionados a esta falta, ou complicações relacionadas a essa falta de medicamentos. Já tive pacientes que simplesmente precisavam de medicamento para pressão, que estavam com a pressão muito alta e tiveram colapso cardíaco”, acrescentou.
Comparação com Várzea Grande
Atuando na UPA Verdão, o médico L.S.F. mostrou a realidade discrepante entre a Saúde de Cuiabá e de Várzea Grande.
Mesmo tendo sido reformada a pouco mais de dois anos, o médico contou que a situação é tão caótica quanto a das outras unidades da Capital.
“A estrutura física da UPA de Várzea Grande é muito similar a onde estou agora, que é a do Verdão, abriu recentemente, é nova, mas há uma diferença absurda na farmácia”, disse.
“Lá em Várzea Grande a gente tem seis tipos de antibióticos, todos os analgésicos, todos os antiinflamatórios, e tem em grande quantidade. Em Cuiabá não tem nada”, disse.
Investigação e suspeitas de esquemas
Os depoimentos foram procedimentos oriundos da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos medicamentos da Câmara de Vereadores de Cuiabá.
A comissão investiga a contratação de empresas terceirizadas pela Secretaria Municipal de Saúde, em substituição a realização de concurso publico e processo seletivo determinado pela Justica como forma de contratação dos servidores do setor.
Nos últimos anos, a Saúde de Cuiabá foi alvo de diversas operações policiais, inclusive da Polícia Federal, com diversas prisões e dezenas de mandados de busca e apreensão.