A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) aprovou, por unanimidade, nesta segunda-feira (13), situação crítica de escassez de água na Bacia do Paraguai, onde está localizado o Pantanal — bioma que ocupa os estados de Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul, no Centro-Oeste do país.
A medida tem vigência até o dia 30 de outubro deste ano. Após esse período, a agência deve avaliar os resultados, podendo prorrogar a medida.
A situação é oposta a do Rio Grande do Sul, que, nas últimas semanas, enfrentou a maior enchente da história. De acordo com último boletim da Defesa Civil do estado, 147 pessoas morreram e 127 estão desaparecidas.
Fenômenos como esses, segundo especialistas, estão ligados às mudanças climáticas. Na região do Pantanal, por exemplo, há um bloqueio atmosférico que provoca ondas de calor (leia mais abaixo).
A declaração de “escassez quantitativa dos recursos hídricos na região hidrográfica do Paraguai” permite que sejam adotadas as providências para prevenção e também de atenuação dos possíveis impactos.
As ações de contingência podem vir a nível federal, estadual e municipal, a depender das necessidades.
A agência também poderá determinar novas regras de uso para as operações dos reservatórios. Além disso, a medida também autoriza as agências reguladoras e as empresas de saneamento a cobrar taxas decorrentes da escassez de água.
Segundo Patrick Tomas, superintendente de regulação de usos de recursos hídricos, entre o período de 1º de outubro de 2023 e 29 de abril de 2024 houve chuva acumulada de 669 mm. A média histórica desse período é de 945 mm. Ou seja, o déficit chuvoso é de quase 30%.
“O monitor de secas, que a ANA disponibiliza para todo o país, monitora a situação das secas em todos os estados e ele ratificou esse quadro de precipitação abaixo da média. O Mato Grosso apresentou seca grave e extrema no sul e no sudoeste do estado”, afirmou.
Segundo instituições como o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPtec), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), a previsão de maio até julho de 2024 também é de chuvas abaixo da média na região.
“Essas chuvas abaixo da média têm um impacto nos rios, na hidrologia. Então, a ANA monitora diversas estações hidrográficas, em especial, nós chamamos a atenção para três estações: Barra dos Bugres, Cárcere, Ladário e Porto Murtinho”, explicou o superintendente, Patrick Tomas
Ainda segundo o relatório da Agência Nacional das Águas, na estação de Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul, por exemplo, a vazão deste ano é a menor em 61 anos.
A vazão de água no dia 30 e abril de 2024 foi de 1.076 m3/s. Essa vazão também está abaixo do valor de referência (1.100m3/s) usado pela ANA para emissão de outorga, ou seja, os instrumentos de gerencia equilibrada da água, possibilitando uma espécie de licença para o uso do recurso.
A partir da publicação da situação de escassez hídrica no Diário Oficial da União (DOU), caberá ao Ministério das Relações Exteriores (MRE) alertar aos países vizinhos que também integram a Bacia do Paraguai. São eles: Paraguai, Argentina, e Bolívia.
Mapa da Bacia do Paraguai, que passa pelos estados de Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul. — Foto: Reprodução/ANA
A Bacia do Paraguai abrange 48% do estado do Mato Grosso e 52% do Mato Grosso do sul. Ao todo, a rede hidrográfica do Paraguai ocupa cerca de 4,3% do território brasileiro.
A hidrovia possui 3.442 km de extensão. Por ela é transportada minério de ferro, soja e outros itens de exportação. Além das atividades de pesca e turismo. Já com relação a geração elétrica, há cerca de 50% de aproveitamento, totalizando 1.111MW (megawatts).
Ondas de calor
A coordenadora e meteorologista do Inmet, Marcia Seabra, explica que há um bloqueio atmosférico na parte central do Brasil atualmente. E que essa obstrução causa as ondas de calor nas regiões centrais, como por exemplo, no Mato Grosso do Sul.
Segundo a meteorologista, essa massa de ar muito quente impede que a frente fria do Sul se desloque para outras regiões do país, o que explica o volume enorme de chuvas no Rio Grande do Sul e a seca na parte central do país, atingindo o Pantanal.
“Há alguns anos, a gente falava que essas chuvas no Rio Grande do Sul poderiam ser consequências do El Niño, mas esse fenômeno sempre existiu e é monitorado desde a década de 1940. O que existe de diferente hoje é o aquecimento global, as mudanças climáticas, o planeta está mais quente, as temperaturas estão mais elevadas”, argumentou a especialista.
Marcia lembra ainda que todos os meses são feitas medições no mundo e que em abril foi registrado o décimo mês consecutivo de recordes de temperatura.
“Os oceanos nunca estiveram tão quentes, além de afetar toda a biodiversidade, se o oceano está mais quente, essa água vai evaporar e chover em algum lugar. O aquecimento dos oceanos e as temperaturas elevadas mantém esse padrão de eventos extremos. Temos chuvas extremas, secas extremas como acontece no Pantanal. Tudo pode ser muito extremo”, prosseguiu a meteorologista.