TJ/C Assessoria
O pleno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso decidiu acatar denúncia criminal contra o ex-deputado Gilmar Fabris (PSD) por fraude em cartas de crédito usadas para pagar dívidas do Estado com agentes da Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz). Os desembargadores também decidiram afastar as imputações formuladas pela Procuradoria Geral da Justiça (PGJ) contra os procuradores Dilmar Portilho Meira, Gerson Valério Pouso, Nelson Pereira dos Santos e Jenz Prochnow Júnior na Operação Cartas Marcadas.
Com o aceite dos magistrados à denúncia contra Fabris e recusa contra os procuradores, o processo pode ser remetido à primeira instância ainda hoje, já que Fabris perdeu o foro privilegiado com o encerramento do mandato parlamentar em 31 de janeiro deste ano. A decisão cabe ao relator, Pedro Sakamoto.
O julgamento do recebimento da denúncia começou no dia 14 de fevereiro, com Sakamoto votando pelo arquivamento do caso. Contudo, devido a pedido de vistas de Orlando Perri, o processo foi adiado naquele dia.
Retomado nesta quinta-feira, os desembargadores votaram pelo recebimento da denúncia contra o ex-deputado. Em sua maioria, os desembargadores seguiram que, para efeito de recebimento da denúncia, se aplica o princípio do in dubio pro societate.
Em sutis divergências técnicas quanto à tipificação penal dos crimes agora imputados a Gilmar Fabris votaram com o relator Pedro Sakamoto os magistrados Rondon Bassil Dower Filho, José Zuquim Nogueira e João F. Filho.
Acompanharam o divergente Orlando Perri os desembargadores Marcos Machado, Sebastião B. Farias, Gilberto Giraldelli, Antonia Siqueira, Paulo da Cunha, Juvenal P. da Silva, Sebastião de Moraes, Carlos Alberto Alves da Rocha e Luiz Ferreira da Silva.
Entenderam de uma terceira outra maneira os desembargadores Guiomar Teodoro Borges, Nilza Carvalho, Rubens de Oliveira, Clarice Claudino da Silva e Dirceu dos Santos.
ALGUNS VOTOS
Orlando Perri concordou em parte com o entendimento de Sakamoto quanto ao cometimento de três crimes. “Está pra mim caracterizada com todas as luzes a falsidade ideológica, como está amplamente escrito na denúncia tipificada como apropriação indébita” e falsificação de documento público. “Quanto ao crime de formação de quadrilha e associação criminosa, comungo plenamente com o relator, porque não está caracterizada, pois o tipo penal exige a estabilidade e permanência de quadrilha ou bando, de modo que se juntar, conluiar para cometimento de um crime específico não caracteriza com todas as luzes associação criminosa”, disse Peri e fundamentou seu entendimento citando doutrina.
Ele e Sakamoto rejeitaram, além de associação criminosa, o crime de falsificação de moeda de crédito público e converteu em falsidade ideológica. A justificativa foi inapetência do Ministério Público em caracterizar adequadamente o crime.
O erro do MP, lembraram, não autoriza rejeição dos fatos relacionados à falsidade ideológica. “Mesmo admitindo que as cartas de crédito são formalmente idôneas porque expedidas por órgão competente, reconheceu a excelência que a falsidade reside em seu conteúdo, de sobrevalorização dos créditos. A apropriação indébita ficou demonstrada”, disse Perri.
Para o desembargador Marcos Machado, o montante de dinheiro subtraído por Gilmar Fabris com anuência dos procuradores foi tão grande e absurdo que, dez anos depois, ainda reverbera nas contas de Mato Grosso. “Esses procuradores deveriam estar ao lado de Eder Moraes, respondendo por esses crimes. Há materialidade e indícios suficientes para que sejam colhidos a responsabilização penal na devida instrução penal, garantidas ampla defesa e contraditório. Nesse caso [deveria haver] imperativo controle judicial, [pois há] documentos públicos em tese ilícitos. Fatos narrados constituem crime e não há causa de instrução de punibilidade para julgamento antecipado da lide penal”, afirmou.
No entendimento de Perri, Sakamoto, Machado e Giradelli, a capitulação de fatos remanescentes que deveriam ser imputados também aos procuradores deu-se exclusivamente porque não foram devidamente tipificados. “Juiz não pode reclassificar fatos narrados na denúncia no momento da acusação nem dar nova definição jurídica de fato, mas o juiz pode e deve absolver sumariamente”.
O CASO
De acordo com as investigações, a fraude teria sido produzida em processos trabalhistas de mais de 300 agentes de administração da Sefaz. Eles buscaram a Justiça requisitando a equiparação com os fiscais de tributos, exigindo a restituição das diferenças salariais de forma retroativa até 1996.
Em 2008, o grupo denunciado teria fraudado os cálculos referentes às indenizações a serem pagas, as fixando em R$ 1,2 bilhão. Na Assembleia Legislativa, Gilmar foi responsável por articular um acordo com os servidores para reduzir este valor, que acabou sendo fixado em R$ 472 milhões.
Na época, o então governador Blairo Maggi firmou o acordo e determinou o pagamento por meio de cartas de crédito. Parte do dinheiro, segundo a denúncia, voltava para os bolsos do grupo.
Além dos réus do caso, as investigações apontaram que o ex-governador Silval Barbosa e o ex-secretário de Fazenda, Éder Moraes, tiveram participação e funções primordiais para a realização do esquema.